Historicamente, as parcerias firmadas entre o poder público e as organizações da sociedade civil (OSC) trouxeram grandes contribuições à sociedade como um todo. No Brasil, há muitos exemplos de ações bem-sucedidas forjadas por uma construção coletiva de instituições do governo e organizações não governamentais.
A criação e a implementação do Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente, o combate à Aids, a campanha pela vacinação infantil e o Pacto pela Infância na década de 1990 são alguns exemplos de mobilizações do governo e sociedade civil que garantiram importantes avanços sociais ao país e estimularam a sistematização do trabalho conjunto, em parcerias técnicas e cooperativas.
Pacto pela Infância
O Pacto pela Infância reuniu os governadores do país e representantes de centenas de organizações da sociedade civil em uma campanha nacional cuja meta era assegurar condições de vida, saúde e educação às crianças, conforme previsto na Constituição federal.
O engenheiro agrônomo libanês Agop Kayayan, especializado em Alimentação e Nutrição era, então, representante do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) no Brasil. Ele participou ativamente da coordenação do Pacto, fomentando a famosa campanha de soro caseiro para reidratação das crianças, entre outras ações que contribuíram diretamente para a redução da mortalidade infantil no Brasil e mobilizaram toda a sociedade para as questões da primeira infância.
Kayayan conta que o Brasil já contava com muitos bons serviços nas áreas de saúde, educação e assistência social, oferecidas tanto pelo governo, quanto por organizações da sociedade civil, entre elas as Igrejas, entidades empresariais, sindicatos e outras, mas não havia uma ação coordenada entre todos estes atores.
A criação do Pacto permitiu esse diálogo e desencadeou ações efetivas de combate à desnutrição infantil. “Antes do Pacto o país era como um enorme aeroporto internacional em que a torre de sinalização fala um idioma que não é compreendido por nenhum dos pilotos das aeronaves. As competências não podem atuar de forma plena. Ficam todos perdidos”, compara Agop Kayayan.
“A experiência tem me mostrado que se você não consegue trabalhar em coalizão, formando uma aliança, um grupo, você não tem sucesso. Tem serviços que o governo faz muito bem, e outros que OSC podem fazer melhor. As ações devem se complementar”, defende Kayayan, que também foi representante do Unicef na América Central. “Não importa o tamanho do país, da economia, a força dos líderes políticos. O tempo é de aliança, de unir experiências diferentes para tratar os diversos aspectos de um mesmo problema”, reforça.
Ação conjunta
Desde então, a atuação conjunta do Estado e das OSC é uma prática crescente no Brasil em todas as esferas de poder. Há algumas décadas o seu funcionamento vem sendo regulamentado para aperfeiçoar a transparência e garantir a eficácia destas colaborações. Um avanço importante deste processo se deu com o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (MROSC), instituído pela Lei federal nº 13.019/2014, e que regula parcerias e repasses de recursos entre a União Federal, Estados e Municípios e as OSC, substituindo os convênios existentes até então.
“O Marco Regulatório é uma conquista, principalmente quando consideramos o seu histórico de elaboração: foi uma iniciativa da rede de associações e entidades conhecida como Plataforma por um Novo Marco Regulatório das OSC, teve participação colaborativa da proposta normativa, com diversos órgãos do governo federal e articulação suprapartidária no Congresso Nacional”, observa Aline Gonçalves, doutoranda em Administração Pública e Governo na Fundação Getúlio Vargas.
Sempre que há interesse da sociedade civil em melhorar um serviço que o poder público não esteja dando conta de oferecer, por insuficiência de recursos humanos e materiais, as OSC especializadas em determinada área, capacitadas e preparadas para tal, podem complementar o serviço, em um trabalho conjunto com o poder público, remunerado com recursos financeiros da administração federal, estadual ou municipal. Isso após o trâmite previsto na legislação que irá aferir que a OSC possui condições de garantir atendimento de qualidade à população em um serviço que, constitucionalmente, é de responsabilidade do governo.
FEAC
Desde sua criação, a FEAC atuou sempre no formato de fundação comunitária, muito comum fora do país. Nesse modelo, a Fundação apoia uma série de entidades de um determinado território em diferentes temáticas, investindo recursos próprios e mobilizando recursos por meio de parcerias com empresas, outras fundações e institutos, campanhas e governo junto a pessoas físicas. No início do ano de 1980, a FEAC já apoiava cerca de 95 entidades sociais.
O superintendente socioeducativo da FEAC, Jair Resende, conta que, nos últimos anos, o trabalho da FEAC tem estreitado o seu relacionamento com a prefeitura de Campinas e outros agentes públicos. “Este ano, há vários projetos com esse foco que atuam tanto em pesquisas/mapeamento para formulação de políticas quanto em planejamento, capacitação e fortalecimento de ações”, explica.
Para isso, a FEAC investiu na implantação do Núcleo de Inteligência Social (NIS). Em 2021, essa frente ganhou mais um reforço com o desenvolvimento do Sistema de Gestão de Programas e Projetos, que passou a amparar todo o trabalho da entidade e das OSC parceiras desde o início deste ano, já que é fundamental ter dados e evidências para otimizar o investimento.
“Com um banco de dados que permita cruzar informações, podemos detectar onde o poder público já está atuando e direcionar nossos investimentos para atender situações ainda não contempladas”, observa Jair. “Um exemplo: se o governo tem um serviço que trabalha com jovens em determinado aspecto, podemos investir em um programa para continuar a partir daquele ponto, de forma a ampliar o resultado”, completa.
Por: Natália Rangel / Fundação FEAC
Fonte: gife.org.br